ENSINAMENTOS DE UM INICIADO

Max Heindel

 

 

CAPÍTULO III

O QUE É TRABALHO ESPIRITUAL?

 

Sobre este ponto apresentaremos trechos de um maravilhoso poema de Longfellow, "A Lenda Formosa" (The Beautiful Legend).

"Sozinho em sua cela,

Ajoelhado no chão de pedra,

O monge rezava em profunda contrição

Por seus pecados de indecisão.

Rezava por maior renúncia

Na tentação e na provação;

O mostrador meio dia marcava

E o monge sozinho em sua cela estava".

"De repente, como num relâmpago,

Um desusado esplendor iluminou

Tudo dentro e fora dela,

E nessa estreita cela de pedra ficou;

E ele teve a Abençoada Visão

De Nosso Senhor, com a Luz do Eliseu

Como um manto envolvendo-O,

Como uma veste abrigando-O".

Contudo, este não era o Salvador sofrido, mas o Cristo que alimentava os famintos e curava os enfermos.

"Em atitude de prece,

As mãos sobre o peito cruzadas,

Reverente, adorando, assombrado,

O monge, perdido em êxtase, ficou ajoelhado".

"Depois, em meio à sua exaltação,

Bem alto e assustador o sino do convento,

Em seu campanário chamando, chamando,

Por pátios e corredores tangeu

Com persistência badalando,

Como nunca antes sucedeu".

Esse era o chamado para seu dever de alimentar os pobres, como Cristo o fizera, pois ele era o esmoler da Irmandade.

"Profunda angústia e hesitação

Misturava-se à sua adoração;

Deveria ir, ou deveria ficar?

Poderia os pobres esperando deixar

Famintos no portão,

Até que se desvanecesse a Visão?

Poderia ele seu brilhante hóspede desfeitear?

Seu visitante celestial desconsiderar

Por um grupo de esfarrapados, bestiais

Mendigos no portão do convento?

Será que a Visão esperaria?

Será que a Visão voltaria?

Então, uma voz dentro do seu peito

Audível e clara sussurrou,

E ele, externamente escutou:

"Cumpre teu dever; isso é o certo,

Deixa aos cuidados do Senhor o resto!"

"Imediatamente pôs-se de pé,

E com um ardente e decidido olhar

Dirigido à Abençoada Visão,

Lentamente deixou sua cela,

Lentamente foi cumprir sua missão".

"No portão, os pobres estavam esperando

Através do gradil de ferro olhando,

Com esse terror no olhar

Que só se vê naqueles

Que no meio de suas misérias e desgraças

Ouvem o som de portas a se fechar,

E de passos que deles correm;

Com o desdém familiarizados,

Com o sabor acostumados

Do pão pelo qual os homens morrem!

Mas hoje, sem o porque saber,

Como a porta do Paraíso

Parecia-lhes a porta do convento ser!

E como um divino Sacramento

Parecia-lhes o pão e o vinho do convento!

Em seu coração o Monge estava orando,

Nos pobres sem teto pensando,

O que sofrem e suportam,

O que não vemos, e o que vemos enfim.

E uma voz lá dentro dizia:

"O que quer que faças

Ao último e menor dos meus,

O fazes a Mim!"

"A Mim! Mas se tivesse a Visão

Vindo a ele em farrapos,

Como um mendigo implorando,

Ter-se-ia ajoelhado em adoração?

Ou teria ouvido com escárnio

E ter-se-ia afastado com aversão". .

"Assim questionou sua consciência,

Cheia de importuna insinuação,

Quando, por fim, com passos apressados

Em direção à sua cela sua face

Contemplou o convento iluminado

Por uma luz sobrenatural,

Como uma nuvem luminosa se expandindo

Sobre o chão, e pelas paredes e tetos subindo".

"Mas parou com uma sensação de pasmo.

Em sua porta, no limiar, A Visão ainda lá estava

Como antes dele a deixar,

Quando o sino do convento assustador,

De seu campanário a chamar, a chamar,

Intimou-o para os pobres alimentar.

Pela longa hora que mediou,

Esperando seu regresso ficou.

E sentiu seu coração inflamado

Compreendendo o significado,

Quando disse o Vulto Amado:

"Eu teria desaparecido, se tu tivesses ficado!"

Vou contar-lhes uma história:

Há muitos e muitos anos atrás - na verdade, há tanto tempo, quase um ontem longínquo - a Terra estava em trevas e o homem tentava em vão buscar a luz. Alguns a haviam encontrado e decidiram mostrar aos outros seu reflexo e, por isso, foram ansiosamente procurados. Entre estes, estava um que havia estado na cidade da luz por algum tempo e conseguiu absorver um pouco do seu brilho. Imediatamente homens e mulheres, vindos do país da escuridão, foram procurá-lo. Andaram milhares de milhas por terem ouvido falar dessa luz; e quando ele soube que um grande grupo se dirigia para a sua casa, começou a trabalhar e preparou-se para dar-lhes o melhor que pudesse. Fincou estacas ao redor de sua casa e colocou luzes sobre elas para que os visitantes não se machucassem na escuridão. Ele e seus familiares proveram as suas necessidades e ele ensinou-lhes o melhor que sabia.

Entretanto, alguns visitantes começaram a murmurar. Esperavam encontrá-lo num pedestal radiante de luz celestial. Imaginavam-se venerando seu santuário; mas, em vez da luz espiritual que esperavam, apanharam-no no momento em que estendia fios com lâmpadas elétricas para iluminar o local. Nem mesmo usava um turbante ou um manto, porque a ordem à qual pertencia, tinha como uma de suas regras fundamentais que seus membros deveriam usar as vestes do país onde vivessem.

Então, os visitantes chegaram à conclusão de que haviam sido enganados, logrados, e que ele não tinha nenhuma luz. A seguir, eles o apedrejaram e também aos seus familiares; tê-lo-iam matado se não fosse por medo da lei que imperava nessa região e que requeria olho por olho, dente por dente. Voltaram, então, para o país das trevas, e sempre que viam uma alma dirigindo-se para a luz, levantavam os braços e aconselhavam: "Não vás para lá; essa não é a luz verdadeira, é como uma lanterna de bruxa que vai levar-te para o mau caminho. Sabemos que não há espiritualidade naquilo". Muitos acreditaram neles e repetia-se nessa ocasião o que foi dito muito tempo antes, e que estava escrito num dos velhos livros: "É esta a condenação: que a luz tenha vindo ao mundo, mas que os homens tenham preferido as trevas à luz".

Como era nesse ontem distante, assim é ainda hoje. Os homens correm de cá para lá procurando a luz. Muitas vezes, como Sir Launfal, viajam para os confins da Terra desperdiçando toda sua vida à procura de uma coisa que chamam "Espiritualidade", mas só encontram desapontamentos atrás de desapontamentos. Sir Launfal passou toda sua vida em vã busca, longe do seu lar, e finalmente encontrou o Santo Graal exatamente às portas do seu próprio castelo. Portanto, qualquer um que honestamente esteja em busca da espiritualidade, com certeza deverá encontrá-la em seu próprio coração. O único perigo é que, como o grupo de viajantes mencionado, ele possa perdê-la por não saber reconhecê-la. Ninguém poderá reconhecer a verdadeira espiritualidade nos outros, enquanto não a tiver desenvolvido em si mesmo.

Portanto, será interessante tentar estabelecer definitivamente: "O que é Espiritualidade?" para termos uma indicação pela qual possamos identificar esta grande característica de Cristo. Para conseguí-lo, devemos abandonar nossas idéias preconcebidas ou do contrário falharemos. A idéia mais comumente aceita é que a espiritualidade se manifesta pela prece e pela meditação; mas, se observarmos a vida de nosso Salvador, veremos que não foi uma vida ociosa. Ele não foi um recluso, Ele não Se afastou nem Se escondeu do mundo. Ele andava entre as pessoas, Ele proveu-lhes as necessidades diárias; Ele alimentou-as quando foi necessário; Ele curou-as quando teve a oportunidade e também as ensinou. Portanto, Ele era, no verdadeiro sentido da palavra, um SERVIDOR DA HUMANIDADE.

O monge da "Lenda Formosa" viu-O quando estava em oração, enlevado em êxtase espiritual. Mas, nesse exato momento, o sino do convento soou as doze badaladas e era seu dever ir e imitar o Cristo, alimentar os pobres reunidos à porta do convento. Na verdade, a tentação de ficar foi muito grande, pois queria banhar-se nas vibrações celestiais; mas, então, ouviu a voz: "Cumpre teu dever, isso é o certo; deixa aos cuidados do Senhor o resto". Como poderia ter ficado adorando o Salvador a quem vira alimentando os pobres, curando os enfermos e, ao mesmo tempo, deixar os pobres famintos fora das portas do convento esperando que ele cumprisse seu dever? Na verdade teria sido injusto se tivesse ficado lá; assim, quando voltou, a Visão lhe disse: "Eu teria desaparecido, se tu tivesses ficado".

Tal auto-indulgência teria sido inteiramente contrária ao propósito em vista. Se não tivesse cumprido fielmente os pequenos encargos, próprios da vida terrena, como esperar que fosse fiel na grande obra espiritual? Naturalmente, se não tivesse sido capaz de resistir à prova, não teria recebido maiores poderes.

Há pessoas que buscam poderes espirituais passando de um centro de ocultismo para outro. Há as que entram para conventos e outros lugares de reclusão na esperança de desenvolver sua natureza espiritual, fugindo do apelo e fascinação do mundo. Aquecem-se ao sol da oração e da meditação, desde o amanhecer até o anoitecer, enquanto o mundo geme em agonia. Depois se espantam por não progredirem; não entendem porque não avançam no caminho de sua aspiração. Preces sinceras e meditação são necessárias, absolutamente essenciais para a elevação da alma. No entanto, estamos destinados a fracassar se, para a elevação da alma, dependermos de orações que não são mais que palavras. Para obter resultados devemos viver de tal maneira que toda nossa vida seja uma aspiração. Como disse Emerson:

"Embora teus joelhos nunca se dobrem,

De hora em hora ao céu tuas preces sobem,

E sejam elas para o bem ou para o mal formuladas,

Ainda assim são respondidas e gravadas".

Não são as palavras que pronunciamos ao rezar que contam, mas sim a vida que conduz à prece.

Qual a vantagem de orar pela paz na Terra aos domingos, quando durante o resto da semana fabricamos armas? Como podemos pedir a Deus que perdoe nossas ofensas como nós perdoamos a quem nos tem ofendido, quando temos nossos corações cheios de ódio?

Há apenas um modo de mostrar nossa fé, e isto é realizado por nossas obras. Não importa qual seja a nossa situação na vida, se estamos numa escala social alta ou baixa, se somos ricos ou pobres, se estamos ocupados em colocar lâmpadas elétricas para evitar que nossos companheiros sofram uma queda física, ou se temos o privilégio de estar numa tribuna apontando aos outros uma luz espiritual, ensinando os caminhos da alma. Não é importante que nossas mãos estejam encardidas pelo trabalho mais humilde, talvez cavando um esgoto para conservar a saúde da nossa comunidade, ou macias e brancas para tratar de doentes.

O fator determinante que decide se qualquer tipo de trabalho é espiritual ou material, é nossa atitude ao executá-lo. O homem que coloca as lâmpadas elétricas pode ser muito mais espiritual do que aquele que se apresenta na tribuna, pois, que tristeza, há muitos que exercem essa sagrada missão com o desejo de deliciar os ouvidos de sua congregação com bela oratória, em vez de prodigar-lhes verdadeiro amor e solidariedade. É um trabalho muito mais nobre limpar um esgoto entupido, como o fez o irmão desprezado no livro "O Servo da Casa" (The Servant in the House), de Kennedy, do que viver falsamente com as honrarias do cargo de mestre, subentendendo uma espiritualidade que na realidade não existe. Qualquer um que tente desenvolver essa qualidade rara de espiritualidade, deve começar oferecendo todo o seu trabalho para a glória de Deus. Quando fazemos, seja o que for, como se a fizéssemos ao Pai, não importa a espécie de trabalho que desenvolvemos. Cavando um esgoto, inventando um mecanismo que poupe trabalho, pregando um sermão, ou desempenhando qualquer outro serviço, tudo é uma obra espiritual quando é feita por amora Deus e ao homem.

 

 

CAPÍTULO IV

O CAMINHO DA SABEDORIA

 

Já faz muitos anos que os ensinamentos dos Irmãos Maiores foram publicados pela primeira vez no "Conceito Rosacruz do Cosmos" e, desde então, nossa literatura ampliou-se bastante. Parece-nos oportuno fazer um levantamento do nosso trabalho para avaliar o que fizemos com os talentos confiados a nós.

Em primeiro lugar, devemos asseverar que a razão de estarmos na Fraternidade Rosacruz é porque, numa determinada época, já não estávamos satisfeitos com as explicações sobre os problemas da vida que recebemos em outros lugares. Todos procuram uma luz sobre o enigma, e há alguns dentre nós que, como o homem de que fala a Bíblia, vendo uma pérola de grande valor vendem tudo o que possuem e compram a pérola, que simboliza o conhecimento do Reino do Céu. Em outras palavras, alguns dentre nós estão tão ansiosos por encontrar a luz e ficam tão contentes quando a encontram, que dão a esse trabalho toda sua vida, seus pensamentos e sua energia. Compromissos assumidos anteriormente impossibilitam a maioria de gozar deste grande privilégio. No entanto, cada um de nós, se recebemos ajuda, somos obrigados pela lei da compensação a dar algo em troca, pois, intercâmbio e circulação estão em toda parte em relação direta com a vida, como a estagnação está com a morte.

Estamos conscientes que não é possível ingerir alimento físico e reter o que comemos, e também sabemos que, a menos que a eliminação mantenha o equilíbrio, logo virá a morte. Da mesma maneira, não podemos impunemente nos fartar com uma alimentação mental. Devemos compartilhar nosso tesouro com os outros e empregar nossos conhecimentos nas obras do mundo, ou correr o risco de estagnação no pântano da especulação metafísica.

Nos anos que se seguiram desde a publicação do "Conceito Rosacruz do Cosmos", os estudantes têm tido bastante tempo para conhecer e praticar esses ensinamentos. Não mais poderão se desculpar dizendo que não conhecem a filosofia por não disporem de tempo de estudá-la e, em conseqüência, não poderem explicá-la aos outros. Mesmo aqueles que têm pouco tempo disponível para estudar, devido aos deveres que desempenham no mundo, deveriam estar agora suficientemente posicionados. "para dar um sentido à sua fé", como Paulo nos exortou a fazê-lo. Mesmo que não consigamos mostrar a luz a todos que a pedem, devemos tentar fazê-lo a nós mesmos, aos Irmãos Maiores e à humanidade. O desenvolvimento de nossa própria alma depende da participação que possamos dar ao movimento ao qual estamos ligados. Portanto, é conveniente que compreendamos detalhadamente qual a missão da Fraternidade Rosacruz.

Isto está inteira e claramente elucidado no capítulo de introdução do "Conceito". Resumindo, a missão é dar uma explicação sobre o problema da vida que irá satisfazer tanto a mente como o coração. Isso deverá resolver a confusão de duas classes de pessoas que estão tateando nas trevas pela carência deste conhecimento unificador, e que podem ser grandemente elucidadas sobre os objetivos de nossos debates: os eclesiásticos e os cientistas. Referindo-nos aos primeiros, designamos todos os que são guiados por uma sincera devoção ou bondade natural, pertençam ou não a alguma igreja. Quanto aos segundos, incluimos os que encaram a vida de um ponto de vista puramente mental, sejam classificados como cientistas ou não. É propósito e objetivo do "Conceito Rosacruz do Cosmos" ampliar o campo de ação espiritual de um número sempre crescente dessas duas classes que pressentem, com maior ou menor clareza, a falta de algo de importância vital em sua visão da existência.

Devemos lembrar que quando Daví desejou construir um templo a Deus, foi-lhe negado o privilégio porque ele havia sido um guerreiro. Atualmente há organizações que estão sempre combatendo outras organizações, sempre encontrando erros e esforçando-se por destruí-Ias, guerreando tanto quanto Daví o fez outrora. Com essa mentalidade, elas não têm permissão de construir o templo que é feito de pedras vivas de homens e mulheres, esse templo ao qual o personagem Manson se refere com tão belas palavras no livro "O Servo da Casa" (The Servant inthe House). Portanto, quando tentamos divulgar as verdades dos Ensinamentos Rosacruzes, devemos sempre ter em mente que não podemos impunemente depreciar a religião de quaisquer outros nem antagonizá-los. Não é nossa missão lutar contra seus erros, que se manifestarão no devido tempo.

Estão lembrados de que quando Daví morreu e Salomão reinou em seu lugar, este teve uma visão de Deus em sonho e pediu sabedoria? Foi-lhe dada a oportunidade de pedir o que quisesse, e ele pediu sabedoria para guiar seu povo. Na verdade, foi esta a resposta que recebeu: "Porque em teu coração pediste sabedoria, porque não pediste riquezas ou vida longa ou vitória sobre os teus inimigos ou qualquer coisa semelhante, mas pediste sabedoria, ser-te-á concedida essa sabedoria e muito mais do que isso". Portanto, será bom que nos dediquemos a orar sinceramente por sabedoria. Para que possamos reconhecê-la, convém comentar o que ela é verdadeiramente.

Diz-se, e é verdade, que saber é poder. Saber, embora em si mesmo não seja nem o bem nem o mal, .pode ser usado tanto para um como para o outro fim. O gênio apenas mostra a propensão para o saber, mas o gênio pode também ser bom ou mau. Falamos de um gênio militar, um que tenha maravilhoso conhecimento de táticas de guerra. Tal homem, porém, não pode ser verdadeiramente bom, pois está destinado a ser impiedoso e destrutivo ao manifestar sua genialidade.

Um guerreiro, seja ele um Napoleão ou um simples soldado, nunca poderá ser sábio, porque deliberadamente deve esmagar todos os bons sentimentos, dos quais tomamos o coração como um símbolo. Por outro lado, um GOVERNADOR SÁBIO TEM UM GRANDE CORAÇÃO, assim como tem uma inteligência superior, para que um equilibre o outro, promovendo o desenvolvimento de seu povo. Mesmo o mais profundo conhecimento sobre assuntos religiosos ou ocultos não é sabedoria, como nos ensina Paulo no seu magnífico 13o capítulo da primeira Epístola aos Coríntios: "Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, se não tiver amor, nada serei". Somente quando o conhecimento se mesclar com o amor é que realmente se converterá em sabedoria, a expressão do princípio de Cristo, a segunda fase da Divindade.

Deveríamos ser muito cuidadosos em diferenciar corretamente esse ponto. Podemos discernir entre o que é vantajoso para alcançar um determinado objetivo e o que o retarda. Podemos optar por sofrimentos presentes visando futuras realizações, mas mesmo nisto não expressamos necessariamente sabedoria. Conhecimento, prudência, discrição e discernimento são próprios da mente; todos, por si só, são tentações do mal, das quais Cristo na oração do Senhor nos ensinou a pedir: "Livrai-nos do mal". Somente quando essas faculdades inatas da mente são temperadas com a qualidade inata do coração, o amor, essa mescla converte-se em sabedoria. Se lermos o capítulo 13o da primeira Epístola de Paulo aos Coríntios, substituindo a palavra sabedoria pela palavra caridade ou amor, entenderemos o que é esta grande qualidade e a desejaremos ardentemente.

Portanto, é missão da Fraternidade Rosacruz divulgar uma doutrina que una o intelecto ao coração. Esta é a única verdadeira sabedoria, pois nenhum ensinamento a que falte qualquer destes componentes pode ser chamado sábio, do mesmo modo que não podemos fazer soar um acorde musical com apenas uma corda. Assim como a natureza humana é complexa, assim também os ensinamentos que vão ajudar alimpar, purificar e elevar esta mesma natureza devem ter aspectos múltiplos. Cristo seguiu este princípio quando nos deu aquela prece magnífica que, em suas sete estrofes, atinge a nota-chave de cada um dos sete veículos do homem e os agrupa nesse magistral acorde de perfeição que chamamos Oração do Senhor (Pai Nosso).

Mas como transmitiremos ao mundo esta maravilhosa doutrina que recebemos de nossos Irmãos Maiores? A resposta a esta pergunta é: agora e sempre vivendo a vida. Diz-se, para o eterno mérito de Maomé, que sua esposa foi sua primeira discípula, e com toda certeza não foram apenas seus ensinamentos, mas a vida que vivia no lar, dia a dia, ano após ano, que conquistou a confiança de sua companheira, de tal modo que ela não hesitou em depositar rias suas mãos seu destino espiritual. É relativamente fácil permanecer diante de estranhos que desconhecem nossas mazelas e para quem nossos defeitos não são visíveis, e pregar por uma ou duas horas cada semana. Mas é muito diferente pregar vinte e quatro horas por dia dentro do lar, como Maomé deve ter feito vivendo a vida. Se tivéssemos o sucesso em nossa divulgação que ele obteve na sua, deveríamos, cada um de nós, principiar pelo exemplo em casa; começar demonstrando aos que vivem conosco que os ensinamentos que nos guiam são realmente de sabedoria. Diz-se que a caridade começa em casa. Esta é a palavra que deveria ser traduzida por "amor" no 13o capítulo da primeira Epístola aos Coríntios. Mude isto também para sabedoria e leia: A divulgação da sabedoria começa em casa. Que seja este o nosso lema através dos anos. Vivendo a vida em nosso lar, promoveremos melhor a causa do que por qualquer outro modo. Muitas pessoas céticas se converteram à Fraternidade Rosacruz através da conduta de seus maridos, esposas ou familiares. Possam os demais segui-los.

CAPÍTULO V

O SEGREDO DO SUCESSO

 

Este é um assunto que deve interessar a todos, pois com certeza todos almejam o sucesso. Mas a questão é: o que constitui o sucesso? Talvez cada indivíduo tenha uma resposta diferente para esta pergunta. Mas, se pensarmos um pouco, será evidente que seja qual for o caminho que sigamos em nosso desejo de alcançar o sucesso, esse caminho deve seguir os rumos da evolução da humanidade. Portanto, deve haver uma resposta comum sobre o que constitui o sucesso e qual o seu segredo. Contudo, seria um erro tentar achar a solução deste problema apenas estudando a vida do homem na época presente. Considerando cuidadosamente o que ele foi no passado, e ficando atentos também ao futuro desenvolvimento da humanidade, temos a única maneira de obter a perspectiva necessária para chegar à perfeita resposta para esta questão importante.

Não precisamos entrar em grandes detalhes. Podemos mencionar que, nas épocas anteriores da nossa evolução, quando o homem em formação surgia de um mundo espiritual para sua presente existência material, o segredo do sucesso estava no conhecimento do mundo físico e nas suas condições. Nesse tempo não havia necessidade de falar aos homens sobre o mundo espiritual e sobre nossos veículos mais sutis, pois estes fatos eram patentes para todos. Nós víamos e vivíamos num reino espiritual. Nesse tempo estávamos entrando no mundo físico, portanto, as escolas de Iniciação ensinavam aos pioneiros da humanidade as leis que governam o mundo físico, e os iniciaram nas artes e engenhos com os quais poderiam conquistar o reino material. Desde essa época até uma data comparativamente recente, a humanidade vem trabalhando para aperfeiçoar-se nesses ramos de conhecimento, que atingiram sua mais alta expressão nos séculos imediatamente anteriores à descoberta do vapor. Estão agora em decadência.

A primeira vista, esta parece ser uma afirmação injustificada, mas um exame mais cuidadoso dos fatos irá rapidamente revelar a verdade nela contida. Na chamada Idade Média não, havia fábricas, mas todas as cidades e aldeias possuíam pequenas oficinas onde o dono, às vezes só ou com artesãos e aprendizes, executava as obras do seu ramo, desde a matéria prima até o produto final, desempenhando sua arte e espírito criativo com toda a alma e coração em cada peça que saía de suas mãos. Se fosse ferreiro, sabia como produzir trabalhos ornamentais em ferro para tabuletas, portões e outras peças que iriam constituir as originais belezas dessas cidades e aldeias medievais. Sua obra também não seria olvidada; ao andar pela cidade podia ver este ou aquele ornamento e orgulhar-se de sua beleza; orgulhar-se também por saber que havia conquistado o respeito e admiração de seus concidadãos por seu trabalho artístico e consciencioso. O marceneiro que preparava a estrutura das cadeiras, também as estofava com trabalhos de tapeçaria, cujos desenhos artísticos tentamos agora imitar. O sapateiro, o tecelão e todos os outros artífices, sem exceção, produziam o artigo final desde a matéria prima, e todos se orgulhavam de sua obra. Trabalhavam arduamente por muitas horas, mas não se queixavam, pois todos gratificavam-se ao exercitar sua criatividade. O canto do ferreiro, acompanhado pelo martelo na bigorna, era ouvido por todos e os oficiais e aprendizes não se consideravam escravos mas mestres em formação.

Depois veio a época do vapor e da máquina e, com ela, um novo tipo de mão-de-obra. Em lugar da produção de um objeto que era confeccionado por uma só pessoa, desde a matéria prima, o que gratificava seu talento criativo, o novo plano preparava os homens para cuidarem das máquinas que apenas faziam parte dos produtos finais. Depois, essas partes eram montadas por outros. Embora este plano diminuísse o custo da produção e aumentasse o rendimento, não deixava campo para o instinto criativo de um homem. Ele se transformou meramente em um dente da engrenagem de uma grande máquina. Na loja medieval, o dinheiro era, na verdade, pouco considerado; o prazer de produzir era tudo; o tempo não importava. Mas sob o novo sistema, o homem começou a trabalhar por dinheiro e contra o tempo, daí resultando que as almas dos mestres, assim como as dos homens ficaram insaciáveis. Perderam o essencial e conservaram apenas a sobra daquilo que torna a vida digna de ser vivida, pois estão trabalhando por algo que não poderão usar nem desfrutar. Isto se aplica tanto ao mestre como aos homens.

Que diríamos de um jovem que se propusesse a acumular um milhão de lenços que nunca poderia usar? Com certeza o consideraríamos um tolo; e por que não colocarmos na mesma categoria o homem que gasta todas as suas energias e se priva de todos os confortos da vida para tornar-se um milionário? Este sistema não pode continuar, pois ele está dando ao homem uma pedra quando este pede pão, e deve estar reservando outro tipo de desenvolvimento para ele. Novos critérios devem estar sendo processados, novos ideais devem estar surgindo para ampliar nossa visão. Sobre a tendência da evolução devemos observar os que dentre nós são melhor dotados e inspirados, como os poetas e videntes. James Russell Lowell emite talvez a nota mais clara em sua Visão de Sir Launfal. Um cavaleiro deixando seu castelo, imbuído do desejo de realizar grandes e corajosos feitos para Deus, vai juntar-se aos Cruzados e procurar o Santo Graal na distante Palestina. Deixa seu castelo satisfeito consigo mesmo, orgulhoso, arrogante, voltado para sua missão. No portão do palácio encontra um pobre mendigo, um leproso, que estende a mão pedindo uma esmola. Sir Launfal não tem compaixão, mas, para ver-se livre daquela coisa repugnante, atira uma moeda de ouro e procura esquecê-lo.

Mas o leproso não ergueu o ouro do pó e disse:

"Melhor para mim é a côdea de pão que o pobre me dá,

e melhor sua mão que me abençoará,

ainda que de mãos vazias de sua porta me deva afastar.

As esmolas que só com as mãos são ofertadas,

não são as verdadeiras.

Inúteis são o ouro e as riquezas dadas

apenas como um dever a cumprir.

A mão, porém, não consegue a esmola abarcar,

quando vem daquele que reparte o pouco que tem,

que dá o que não é possível visualizar.

- esse fio de beleza que tudo sabe unir,

que tudo sustenta, penetra e mantém -

O coração ansioso estende a mão

quando Deus acompanha a doação,

alimentando a alma faminta,

que sucumbia só na escuridão".

Mas, e Sir Launfal? Com esse modo de pensar poderia esperar alcançar sucesso e encontrar o Graal? É claro que não. Só encontra decepção sobre decepção e, por fim, retorna a seu castelo, desalentado e com o coração humilde. Aqui, depara-se novamente com o leproso, mas, ao vê-lo,

"Seu coração era só cinza e pó.

Ele partiu em duas, sua única côdea de pão,

ele quebrou o gelo da beira do córrego

e ao leproso deu de comer e beber pela mão".

Tendo cumprido seu ato de misericórdia, recebeu a recompensa:

"Não mais o leproso ao seu lado se curvava Mas, à frente dele, glorioso se levantava".

E a voz, ainda mais doce que o silêncio, disse:

"Vê, Sou Eu, não temas!

Na busca do Santo Graal, em muitos lugares

Gastaste tua vida, sem nada lucrares.

Olha! Ei-lo aqui: o cálice que acabaste de encher

com a límpida água do regato que Me deste de beber.

Esta côdea de pão é Meu corpo

que foi para ti partido.

Esta água é Meu sangue

que na cruz por ti foi vertido.

A Santa ceia é mantida, na verdade,

Por tudo que ajudamos o outro em sua necessidade.

Pois a dádiva só tem valor

quando com ela vem o doador

e a três pessoas ela alimenta assim:

ao faminto, a si própria e a Mim".

Nestas palavras está o segredo do sucesso, que consiste em fazer as pequenas coisas, talvez algumas aparentemente desagradáveis que estão próximas de nossas mãos, em lugar de ir longe à procura de fantasmas quiméricos que nunca se transformarão em algo definido e tangível.

Que representa para nós o que foi relatado anteriormente? Ainda uma vez podemos obter a resposta de um poeta, Oliver Wendell Holmes, que nos fala do pequeno náutilo. Primeiro ele constrói uma concha, suficientemente grande para abrigá-lo. À medida que vai crescendo, constrói outro compartimento maior que passa a ocupar até o período seguinte do crescimento, e assim por diante até construir uma concha em espiral, tão grande quanto possa, e depois a abandona. Esta idéia ele a transmite nas seguintes estrofes:

"Oh, Minh'alma! Constrói para ti mansões mais majestosas,

enquanto as estações passam ligeiramente!

Abandona o teu invólucro finalmente;

Deixa cada novo templo, mais nobre que o anterior,

com cúpula celeste, com domo bem maior,

e que te libertes, decidida

largando tua concha superada nos agitados mares desta vida!"

Quando atingirmos este ponto, teremos alcançado o sucesso - todo o sucesso que podemos conquistar em nosso mundo atual - e estaremos entrando numa nova esfera de melhores oportunidades.

 

CAPÍTULO VI - A MORTE DA ALMA

 

 

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