O Culto dos Mortos

Um grupo de carpideiras.

Túmulo de Ramosé, XVIII Dinastia

 

 


É muito antigo o uso de consagrar aos finados um dia em cada ano, para orar por eles e para lhes dedicar pensamentos carinhosos; mas não sabemos, ao certo, qual foi a primeira nação ou povo que dedicou aos finados um culto, na forma em que chegou até aos nossos dias.

O culto dos finados vem de tempo tão distante que não se lhe conhece a verdadeira origem, mas certamente enraíza no conhecimento dos povos antigos, que tinham contacto directo com os mundos invisíveis, comunicando facilmente com as pessoas falecidas e com os seres que vivem nesses mundos, aos quais conhecemos por elementais ou espíritos da Natureza, e também com os restos dos finados. Estes restos são constituídos pela parte dos corpos subtis que o espírito não pôde assimilar e por esse facto voltam para o corpo onde foram reunidos, para com ele se dissolverem e voltarem a formar novos corpos – de plantas, de animais e da própria Humanidade.

O culto dos finados tem as suas vantagens e os seus inconvenientes, pode ser bom ou mau para os finados e para aqueles que o praticam inconscientemente, motivo porque buscaremos esclarecer a sua densa obscuridade.

Os Cristãos primitivos de Roma, acharam no culto dos finados um maravilhoso apoio para a sua crença, pois eram ferozmente perseguidos pelos clérigos das religiões dominantes e não podiam reunir livremente para fomentar o progresso do Cristianismo. E como nesse tempo era uso orar junto das sepulturas, e o cemitério de Roma era numa tenebrosa caverna, os Cristãos fizeram dela o seu ponto de reunião mais seguro, e aí, à luz baça de archotes realizavam as suas reuniões, abertas e encerradas sempre com orações e cânticos. Porém ao tenebroso local iam rezar pelos finados muitas outras pessoas, e outras ainda buscavam nos tais restos dos mortos apoio para vinganças e práticas de magia negra, e por estas pessoas foram descobertos os Cristãos e os seus misteriosos ajuntamentos, do que resultaram novas perseguições, na cidade e nas cavernas onde se estabeleceram as catacumbas, ou túmulos, para os cadáveres dos romanos.

Nos túmulos dos Cristãos eram gravados dois peixes, ou um peixe e uma cruz, como sinais duma época nova e da vida eterna, que não pode ser detida nem aniquilada pela ferocidade dos seres humanos. Os peixes simbolizavam o signo zodiacal onde transitava o SOL, o Cristo Cósmico, o que indicava uma nova era, de sofrimento e silêncio, na qual a Humanidade se libertaria da escravidão dos grandes senhores para cair na escravidão dos sentidos e dos poderes eclesiásticos, que limitariam terrivelmente a liberdade de consciência, buscando sujeitar todos ao mesmo credo pelos sistemas duríssimos usados pelos tribunais da Inquisição. Era uma nova ordem de sofrimento chamando a Humanidade para o verdadeiro sentido da Cruz, a Vida Eterna, que vem a ser o objectivo de nossas vidas. A Cruz simbolizava para os Cristãos, como para outros povos muito mais antigos, a vida que se manifesta em duas grandes linhas: uma vertical, que nos seres humanos entra pela cabeça, desce ao longo da espinha e se escoa pelos pés; outra horizontal, destinada aos animais, que vivem na posição horizontal, entrando-lhes pela cabeça, correndo ao longo de suas espinhas e escoando-se pelas patas. Nós, em posição vertical, e os animais em posição horizontal, formamos uma cruz. Esta simboliza, também, os dois pólos que geram e movimentam a vida: o macho e a fêmea; o espírito e a matéria de que se reveste em cada existência terrena.

Se forçássemos um animal a viver na posição vertical, ocasionaríamos graves prejuízos na sua vida e podíamos levá-lo à morte. O mesmo sucederia aos seres humanos se fossem abrigados a viver na posição horizontal, isto é, apoiando-se nos pés e nas mãos.

A cruz simboliza a vida eterna, a vida que não se extingue nunca, a vida que sustenta os mundos e os seres neles evolucionantes. A cruz trazida pelos Cristãos era, havia milhares de anos, o símbolo da vida eterna; e ao traçá-la sobre os alimentos ou sobre a testa, era sempre a memória da vida eterna, a recordação de que formávamos parte da vida eterna e de que devíamos preparar-nos para vida eterna, vencer a morte, isto é, as condições que nos forçam a oscilar entre uma existência material, sombria, amarga, enganosa e cheia de sofrimento, e outra em que somos livres da limitação da matéria, onde não há engano nem sofrimentos, mas a vida eterna.

Cristo deu-nos uma religião nova, simbolizada pela cruz onde foi crucificado. Portanto, não devemos olhar para a cruz como se fora um símbolo de morte, quer dizer de aniquilação total, mas de vida eterna, de libertação das condições mesquinhas da Terra, onde muitos se deixam conduzir entre ilusões vãs, perdendo aquele tempo precioso que deviam aproveitar no sentido de subirem à vida eterna, de se prepararem para a vida eterna por meio do seu aperfeiçoamento individual constante, e da prática da caridade. A cruz simboliza o resgate espiritual das condições penosas da Terra.

A cruz é traçada na hóstia onde se diz estar concentrada a divindade crística, tal como está no alto dos céus; nos cemitérios dos Cristãos primitivos era posta sobre o ponto da sepultura onde repousava a cabeça do finado uma cruz de madeira, de pedra ou de ferro. Num caso e noutro, a cruz serve para indicar o poder criador, divino, eterno, que não pode ser limitado pela matéria e que nos libertará das condições terrenas por meio dum aperfeiçoamento constante.

A morte não destrói se não na medida em que necessita construir; a morte não é mais do que transformação e regeneração; a morte edifica sempre, porque incessantemente movimenta os materiais com que são edificados os nossos corpos, verdadeiros templos de espíritos.

A cruz posta na sepultura não chama sobre o finado a clemência divina, mas recorda aos vivos que ao fim das suas existências podem não estar suficientemente preparados para a Vida Eterna, e lembrar-lhes que devem aproveitar o seu tempo para se libertarem dos prazeres enganosos da carne, dos vícios que sempre nos prendem à Terra e nos fazem sofrer e prolongar por longo tempo a nossa evolução, quer dizer o nosso aperfeiçoamento espiritual, a nossa libertação das condições ilusórias e sombrias da Terra, a nossa preparação para o resgate almejado pelo Ego evolucionante.

Não vejam, portanto, na Cruz, um símbolo de tristeza e de sofrimento, mas unicamente um símbolo de Vida Eterna.

Na sepultura onde os Cristãos puseram a cruz dá-se começo a uma nova existência e, portanto, pela cruz se indica a continuação da vida.

Não devemos temer a morte, porque por ela subimos a novas condições. Todavia, se a morte for violenta, o sofrimento estará nela patente; mas se a morte for por suicídio o sofrimento será muito maior, incalculável para nós, na sua intensidade e duração, pois neste caso nenhuma ajuda pode ser recebida, o suicida fica inteiramente entregue a si próprio, para que examine profundamente a extensão do mal que fez a si próprio e nunca mais o repita.

Na morte natural, ao fim do som que vibra no arquétipo de cada um de nós, o desprendimento será suave, sem dor nem consciência do que se está passando, porque nesse momento, se nos deixarem no mais absoluto silêncio, estaremos contemplando a vida que terminou, partindo desse momento para trás, para o nascimento, e as imagens assim vistas absorvem toda a nossa atenção, desviam-nos de tudo o mais. Portanto, se temos muito amor a alguém, e o queremos ajudar ao finar-se, façamos silêncio junto dele, e se sabemos orar, elevemos em silêncio, quer dizer mentalmente, a nossa oração por ele, que pode ser a estabelecida por Cristo para os que haviam de seguir o seu Caminho.

Os Cristãos primitivos de Roma não iam à lôbrega caverna orar pelos defuntos, como faziam os romanos que não eram cristãos. Eles só naquele local podiam reunir no maior sossego, planear a orientação do seu credo e pedir o apoio Divino para a sua obra. Mas os romanos vulgares, pagãos, iam às catacumbas para rezar pelos finados e nas suas próprias casas prestavam culto aos Manes, que são os restos das personalidades dos finados seus familiares. Este condenável costume foi levado por eles a toda a parte aonde foram os romanos. Era o culto dos antepassados, que atraía para os seus lares as personalidades dos mortos. Estas personalidades são criadas por tudo quanto há de mais vil em nós e são os restos dos finados que o espírito não pôde levar consigo, por pertencer inteiramente ao mundo material. Na Índia, tais personalidades ou restos dos finados são conhecidas por Kama-Rupas, restos dos corpos de desejos das pessoas mortas, sempre nefastos para os vivos. Todavia os romanos, na sua crença estúpida, chamavam a tais restos deuses lares e manes, prestavam-lhes culto, e assim essas entidades os escravizavam, exigindo deles a prática dos vícios que lhes deram origem, e perturbando terrivelmente a sua ascensão a melhores condições espirituais. Os referidos restos dos finados, kama-rupas, personalidades, manes ou lares, vivem junto dos cadáveres e por esta razão a visita às campas dos finados é sempre molesta, doentia, condenável, porque tais elementos podem vampirizar os vivos, e nem só sugar-lhes a vitalidade até ao ponto de lhes perturbar a saúde, mas despertar neles a inclinação a vícios, com o que muito prejudicarão o avanço espiritual das suas vítimas.

Ir aos cemitérios não é, de modo algum, coisa salutar, e para pessoas com certas condições mediúnicas constitui um perigo. Mas sobretudo, a permanência junto das sepulturas é muito mais perigosa. Portanto, certas pessoas não devem ir aos cemitérios; a permanência junto dos túmulos é sempre perigosa para a saúde moral e física das pessoas. E sobre estes prejuízos outro surge, não para os vivos, mas para os finados, que são interrompidos no seu trabalho purgatorial e chamados para junto das sepulturas, onde vêem chorando aqueles entes queridos que deixaram, tantas vezes em grande penúria e dificuldades, sofrendo terrivelmente com isso. E como se este mal não bastasse, outro maior surge; vêem os seus corpos em decomposição e não podem fazer ouvir as suas palavras. Portanto, a ida aos cemitérios causa transtorno aos finados, que deste modo são forçados a ver a decomposição de seus corpos e a assistirem a cenas de grande tristeza. Se nas sepulturas acenderem velas de cera, os espíritos e as personalidades dos finados serão mais fortemente atraídos por essas luzes, o que torna ainda mais duro o suplício dos finados.

Se desejamos manter o culto dos finados, devemos prestá-lo no íntimo dos nossos corações, em respeito e amor puros por eles, pois deste modo lhes provaremos que sempre os temos presentes e os estimamos, o que será para eles um verdadeiro prémio de consolação. E podemos ajudá-los orando por eles, pedindo por eles a Deus, em termos simples mas sinceros, o que muito os consolará.

As personalidades dos finados dissolvem-se no mundo elemental, na região que os gregos chamaram HADES, os egípcios AMENTI, os hindus Kama-Loka, e os Católicos LIMBO.

Kama-Loka indica a região onde pairam as formas criadas por maus desejos (lascívia, luxúria ou concupiscência) os quais nos prendem à existência terrena, por meio de tentações. Kama-rupa é o centro para onde convergem as paixões animais, que constitui o famoso personagem que chamamos personalidade ou restos dos finados; é o corpo de desejos ou corpo astral, na sua parte mais baixa de que o Ego se liberta para seguir o seu caminho de ascensão espiritual. Limbo é o mundo de desejos, na sua parte mais baixa, onde está a matéria na sua forma primordial, ainda invisível para a nossa vista, mas que se tornará visível gradualmente na medida em que o espírito a materializa para poder manifestar-se neste mundo.

O Limbo e a parte inferior do Purgatório, onde ficam os Egos que foram expulsos de seus corpos em tenra idade e por esse motivo voltam a renascer em curto prazo, e quase sempre nos mesmos pais. Os clérigos dizem que as crianças que morrem sem terem sido baptizadas ficam no Limbo. Na realidade não é assim, pois todos passamos no Limbo antes de entrar no estado purgatorial; mas as crianças que foram mortas antes de terem que fazer na região purgatorial aguardam aí que lhes seja permitido renascer novamente.

O Limbo é a região das sombras silenciosas em que os magos negros buscam apoio para a sua criminosa actuação, porque o mal só pode aumentar o seu poder apoiando-se nas forças maléficas; e os desejos e paixões impuros que criam as personalidades, essas estranhas sombras silenciosas, encontram o seu campo de cultura nesta região sombria que constitui a chamada atmosfera da Terra.

Já vimos que o culto dos finados não foi estabelecido pelos Cristãos; acrescentaremos que no III século da era Cristã, já na China se prestava aos finados um culto estranho e esplendoroso, o que nos diz ser muito antigo ali. Este culto foi introduzido na igreja Católica no dia 2 de Novembro de 998, data em que Santo Odilon, um dos primeiros abades da ordem beneditina de Cluny, estabelecida em França, o incluiu no número das suas solenidades, dando assim origem a que todo o orbe Católico Romano o adoptasse. E assim ficou, até hoje, consagrado ao culto dos finados o dia 2 de Novembro.

A Lua comanda os processos vitais, e também a morte. Não há gestação sem a influência da Lua, e o desencadear das forças da morte é comandado também pela Lua Nova.

Em Tinagoogoo, China, o culto dos finados era celebrado por ocasião da sétima Lua Nova de cada ano, dia consagrado ao DEUS dos Mil Deuses. Os Católicos Romanos, e não sabemos se os restantes, dedicaram o primeiro dia de Novembro ao culto de Todos os Santos, e o segundo ao culto dos finados.

Os sacerdotes chineses celebravam, no dia da sétima Lua Nova de cada ano – dia do Deus de Mil Deuses –, missas com o propósito de libertar do Purgatório os espíritos aí retidos pelas suas personalidades ou Kama-rupas, no exame do que fora a sua vida neste mundo, não se esquecendo dos que morreram em terra ou no mar. E a Igreja Católica Romana também instituiu missas no dia 2 de Novembro, para sufragar os espíritos que vivem no Purgatório, e numa delas faz-se no centro do templo um simulacro de ataúde, coberto com pano preto ornamentado com franjas de prata e outras de ouro, sendo a missa cantada e sobre o simulado caixão lançada água-benta e incenso, como se costuma fazer na cerimónia do enterro. Na China, os sacerdotes, durante as cerimónias pelos finados, entoavam cânticos que chamam TANTRAS (palavras que formam um conjunto mágico de feição genesíaca), e ao mesmo tempo espalhavam muito arroz, como que para alimento dos demónios ou personalidades dos finados, sempre famintas e sedentas de tudo quanto lhes deu origem, e para que pudessem minorar o seu desespero, e ao mesmo tempo procuravam alegrar os finados de sete gerações, que julgavam conservar-se ainda no Limbo ou Purgatório. A esta cerimónia deram o nome de ULLAMBANA.

Segundo um cotado autor, «toda a teoria, com ideias de orações intersessórias, letanias e réquiens sacerdotais e culto ancestral, é completamente estranho ao antigo Budismo do Sul» da China.

Tanto o culto ancestral como os tantras revelam o apego daqueles povos ao formulário maldito da feitiçaria, razão porque mostravam grande interesse em sustentar a sua ligação aos elementos chamados de baixo astral, que são o sustentáculo dos magos negros e a animação das famosas sessões de espiritismo. Tais elementos ou restos dos finados estão sempre prontos para enganar e maleficiar os seres humanos, razão porque não devemos frequentar as sessões de espiritismo nem os cemitérios.

Na bruxaria cultiva-se conscientemente relações com os kama-rupas ou personalidades dos finados, para maravilhar os desgraçados que buscam tais apoios, e para lhes extorquir dinheiro; no espiritismo procede-se de boa-fé, ignorantemente, tomando tais restos de finados como sendo espíritos. E, como alguns não podem sustentar conversa com os vivos, ou não dizem coisa com coisa, os espíritas julgam estar na presença de almas perturbadas, espíritos sofredores, e tratam de pedir por eles, quando na realidade tais formas ou sombras nada têm de espiritual, sendo tão mortais como os corpos em que foram geradas.

Quem exercita ou desenvolve médiuns adquire uma grave responsabilidade, pois abre francamente a entrada a uma verdadeira escória do mundo invisível ao corpo duma pessoa que ficará à mercê de todos os aventureiros invisíveis, que poderão apoderar-se do seu corpo e causar-lhe graves danos, arrastando quase sempre o médium à prática da imoralidade e até ao crime. O que devemos fazer sempre, é fechar o acesso de entidades invisíveis ao corpo das pessoas, e não abrir essa entrada.

O culto dos finados, tal como se fazia na China, mantinha os vivos em estreita união com as personalidades dos falecidos. Estas personalidades foram criadas pelos vícios, paixões vis, e assim, na China vemos, em certos costumes depravados da mocidade masculina, um vestígio desses tantras que formam parte da magia sexual, própria de seres muita apegados às coisas terrenas. Tal culto nem só constitui um grave erro, mas também um verdadeiro perigo para as nossas condições evolutivas. Nascer e morrer, tal é a lei terrena; viver é a Lei Suprema. Nascer e morrer é coisa desagradável, e não sabemos qual será melhor. Quando nascemos neste mundo, morremos para o mundo espiritual donde viemos; morrendo aqui, nascemos para o mundo espiritual donde tínhamos vindo; cá e lá temos amigos que sempre nos esperam e nos ajudam, aqui como pais, parentes e amigos, lá como guias e auxiliares nos primeiros tempos, quando ainda não tomámos inteira consciência do novo estado.

Antes de nascer, por ignorância dos pais, e muitas vezes por ignorância da mãe, sofremos; depois do nascimento, ainda pela mesma ignorância, faltam-nos cuidados, carinhos, comodidades que se reflectem no desenvolvimento de nossos corpos, e por isso nós sofremos também.

Um espírito da Natureza ou elemental fez o molde ou arquétipo do corpo que havemos de possuir e ele mesmo opera todo o trabalho necessário para o seu enchimento, até que tenha completado a obra admirável que somos fisicamente. A partir de certa época nós vamos tomando contacto com o embrião, e com ele estaremos inteiramente ligados ao fim de certo tempo. Depois, até à morte, manteremos essa ligação; a partir do momento da morte iniciaremos o abandono do corpo e este ficará novamente a cargo dos espíritos da Natureza, para que o dissolvam e voltem a utilizar os seus elementos na construção doutros corpos. É assim a vida!

No momento em que exalamos o último suspiro, se junto de nós for guardado profundo silêncio, veremos em paz o filme da vida que findou, e com ele partiremos para fora da órbita desse corpo que pode e deve ser queimado, para deste modo se acelerar o processo de decomposição, e impedir que fiquem restos perturbando os vivos. A recolha do filme da nossa vida pode levar de alguns momentos até três dias e meio. Portanto, não convém queimar os cadáveres antes de três dias e meio.

Depois de terminada a recolha das imagens da vida que terminou, o espírito abandona totalmente o corpo e vai, através das sombras silenciosas, onde encontra o seu guardião do Umbral, que procura embaraçar-lhe a passagem, por o julgar indigno de passar além desta região ou Limbo, onde procura detê-lo, apenas para o preparar devidamente para entrar no estado purgatorial. No Limbo estão as formas sombrias de tudo o que fizemos com as nossas paixões e portanto é desagradável estar ali. Mas é bom saber que saboreamos as consequências do mau uso que fizemos de nossos corpos, deixando-nos cair na luxúria e na maldade. Depois entraremos no estado purgatorial, e aí começaremos a ver o filme da vida que findámos, mas já não o vemos do fim para o começo, do princípio para o fim; já não vemos filme sem dor, indiferentemente mas sentimos a acção do mal que fizemos, e sentimo-la muito mais intensamente, pois o estado purgatorial dura, para as pessoas más, cerca dum terço da vida que viveram, e para os bons durará muito menos, porque a duração está sempre em harmonia com as acções que fizemos. Quanto maior foi a maldade, maior será o sofrimento; quanto mais intensamente vivemos nos vícios e paixões sensuais, mais sofreremos, mais tempo estaremos no purgatório; quanto menos viciosa foi a vida, menos permaneceremos no estado purgatorial. Se nesta vida examinamos diariamente os actos praticados, e meditamos todo o seu valor, sofrendo por esse motivo o remorso de termos sido injustos e deliberamos corrigir os nossos maus hábitos e atitudes, vamos tornando melhor o nosso carácter, e no purgatório sofreremos menos, podemos até passar muito rapidamente sobre ele.

No purgatório não ardemos em chamas, como temos visto nas pinturas religiosas, mas vemo-nos a causar o mal e no mesmo instante sentimos todo o sofrimento que causamos! Somos, no mesmo pé, actores e espectadores, algozes e vítimas, e assim aprenderemos a ser mais justos e perfeitos, a emendar o erro, a buscar a perfeição que consiste em não fazer aos outros o que não desejamos que eles nos façam. Assim aprenderemos a ser sinceros e a combater a hipocrisia que leva a parecer uma coisa sendo outra; aprenderemos a ser simples, a ser melhores do que parecemos, e a repelir a hipocrisia, e a castigá-la como coisa má, indigna. E se fazemos algum mal, sentiremos a necessidade de penitenciar-nos com aquele ou aqueles que foram molestados. O estado purgatorial é, portanto, onde temperamos os nossos metais, e tornamos mais duros e perfeitos, capazes de resistir a todo o mal.

No purgatório veremos um a um todos os nossos actos e provaremos todo o valor do mal que fizemos; depois entraremos em novo estado, onde novamente o Guardião do Umbral nos procura impedir o caminho, pois não podemos ir dum estado a outro sem a necessária preparação. Este segundo estado chama-se primeiro Céu, e nele entramos na contemplação de todo o bem que fizemos. Aí nos vemos fazendo o bem e sentimos a alegria e gratidão que o mesmo bem despertou naqueles a quem o fizemos, e então sentimos intensamente a necessidade de não voltar a fazer o mal, e de ser sempre bons, inteiramente bons, pois o mal nos fez sofrer e o bem nos deu felicidade, um gozo que perdura, um bem que se perpetua e constitui a nossa maior glória. Então deliberamos firmemente não repetir nenhum dos maus actos, mas sim e somente os bons. Seguidamente passamos a um outro estado, no qual a felicidade aumenta e neste estado revemos os materiais recolhidos e preparamos o programa da próxima volta ao mundo. Porém, como estamos animados pelas forças do bem, quase sempre elaboramos um programa demasiado carregado de experiências, o que tornará o destino dessa vida mais duro e tantas vezes impossível de realizar! Depois, ignorando que fomos nós quem urdiu esse destino, muitas vezes nos revoltamos, e tantos se suicidam por julgarem que não poderão suportar por mais tempo o rigor do que chamam adversidade!

O que fazemos numa vida tece o destino da vida próxima, e isto nos leva a dizer que os nossos actos esperam sempre por nós e preparam o nosso destino.

Alguns, antes de estabelecerem a ligação definitiva com o corpo, desertam, fogem, tomados de pânico, e então dá-se o aborto natural, que tantas vezes é causa de desgosto para a mulher, e para o casal!

Depois do trabalho preparatório da existência próxima, no segundo Céu, entramos noutro estado celeste, o último, onde atingimos a felicidade suprema, e onde permaneceremos por todo o tempo que faltar para novamente renascer.

Após a morte, cessa todo o sofrimento; enquanto passamos no Limbo também não sofremos, nem gozamos, nem evoluímos.

O Limbo é uma espécie de museu de formas feias, construídas por todos os nossos desejos e emoções de carácter inferior, e nele se dissolvem, lentamente, essas sombras hediondas que criámos com os nossos desejos impuros.

Se desejamos apressar o nosso crescimento espiritual, isto quer dizer a nossa libertação das condições duras da Terra, meditemos bem e procuremos viver estas palavras de Cristo:

«Buscai primeiramente o reino de DEUS e a sua Justiça e o demais se vos dará por acréscimo».

Busquemos primeiramente cultivar a virtude, exercer a bondade, fazer pelos outros tudo quanto gostaríamos que eles fizessem por nós, e assim estaremos caminhando no Reino de Deus e praticando a sua Justiça. Deste modo abreviaremos grandemente a nossa permanência no estado purgatorial, e sentiremos a glória do bem que fizemos, apressando o ritmo da nossa evolução.

O melhor culto que podemos prestar aos nossos mortos não exige clérigos, nem templos, nem cerimoniais; ele resume-se em nos recolhermos dentro de nós mesmos, recordando-os, por momentos, com simpatia e gratidão, lançando sobre eles pensamentos amorosos, e rogando aos poderes divinos toda a ajuda para que cedo se libertem das condições em que vivem agora na região purgatorial. E isto lhes dará ânimo, coragem para lutar até ao fim das suas provas. E se temos algum agravo de alguém que se finou, lancemos sobre ele o nosso perdão piedoso, pedindo também para ele a Luz Divina. E assim prestaremos o melhor culto aos finados.

 

Palestra lida no Ramo S. Paulo,
em 2 de Novembro de 1953

 

Francisco Marques Rodrigues

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